sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Cremes não evitam envelhecimento

A pele é a parte mais maltratada do corpo. Maltratada por excesso de cosméticos, por agressões químicas e pelos excessos de radiação solar a que nos expomos, paradoxalmente, perseguindo a beleza e a juventude. O resultado é um envelhecimento precoce que logo se tenta combater com cremes. Às vezes são anunciadas fórmulas milagrosas que prometem manter a pele jovem e firme. São realmente eficazes ou apenas produtos prazerosos?

A utilidade dos cremes cosméticos é um tema muito controvertido no qual confluem importantes interesses econômicos, campanhas publicitárias agressivas e o prazer do consumidor ao adquirir produtos que supostamente rejuvenescem. Mas neste caso ciência e cosmética não andam de mãos dadas, e embora os cremes básicos dêem luminosidade e mantenham a pele saudável em bom estado nem estes nem os que contêm outras substâncias rejuvenescedoras evitam o envelhecimento da pele. A proteção solar é o único fator da cosmética que influi diretamente no processo de envelhecimento.

"A pele tem uma capacidade de equilíbrio espontânea extraordinária. A partir da puberdade, fabrica uma película hidrolipídica que a protege das agressões externas. E se não for eliminado esse manto benfeitor pelo uso de sabonetes, cremes para maquiar, demaquiar, não há necessidade de cremes", afirma Ramón Grimalt, professor da Universidade de Barcelona e dermatologista do Hospital Clínic de Barcelona. "Há muitos exemplos disso. Todos conhecemos pessoas que por sua natureza têm uma pele fantástica e avós octogenárias com aspecto invejável, que nunca usaram um creme." Peles muito bem conservadas como a de Dolores Martínez, que vive em Granollers, tem 93 anos e nunca usou cremes cosméticos. "Também vemos isso nos homens, que envelhecem na mesma velocidade que as mulheres e na maioria dos casos nunca utilizaram qualquer cosmético", acrescenta Grimalt.

Círculo vicioso

Os cremes hidratantes atuam como uma barreira de proteção contra as agressões externas quando se perde a capa natural. Mas se forem utilizados quando não são necessários essa pele normal pode se transformar em gordurosa, que seria preciso tratar com outro cosmético. O desconhecimento dos usuários, de um lado, e os novos hábitos de higiene da sociedade moderna, alguns deles introduzidos pela indústria cosmética com fins meramente comerciais, por outro, conduzem a uma má utilização desses produtos.

"É um jogo em que primeiro se vende o gel que deixa a pele seca e depois o creme para hidratá-la. Essa tática também foi introduzida na higiene infantil. A pele da criança não produz gordura e só deveria ser ensaboada ao redor do ânus e as mãos, quando estão sujas. Os adultos também não deveriam ensaboar as pernas e os braços, porque o suor nessas áreas não é gorduroso e se elimina com água", afirma Grimalt, que também é presidente honorário da Sociedade Européia de Dermatologia Pediátrica.

A má utilização leva ao desastre, mas também há especialistas que defendem os cosméticos, desde que utilizados adequadamente. Aurora Guerra, chefe da seção de dermatologia do Hospital Universitário 12 de Outubro de Madri e presidente da Seção Centro da Academia Espanhola de Dermatologia e Venereologia (AEDV), concorda que os cosméticos não podem tratar o envelhecimento da pele, mas defende sua utilidade, como declarou no Congresso Nacional da AEDV, realizado em meados de junho em Barcelona.

"Os cosméticos", afirma, "conseguem mais luminosidade, mais firmeza, diminuem a intensidade das rugas e alguns deles fazem desaparecer defeitos como as manchas produzidas pelo sol ou pela idade. Os cremes não podem tratar o envelhecimento, mas ajudam. É verdade que não se pode ter 20 anos aos 50, mas sim os melhores 50", afirma Guerra.

Em relação às moléculas rejuvenescedoras que são acrescentadas aos cremes básicos, embora tenham demonstrado certa melhora na pele, comprovada com testes objetivos (por exemplo, medidas do relevo cutâneo com molde de silicone ou medidas do tempo de reposição epidérmica através de corante ou grau de hidratação), não superaram os severos critérios de avaliação da medicina baseada na evidência.

"Até agora não existe nenhum estudo científico independente que tenha constatado a eficácia de qualquer das substâncias modernas rejuvenescedoras. Se aplicar em uma face qualquer das substâncias que pretendem ter alguma função e na outra se colocar exclusivamente uma mistura de azeite com água, que o que é um creme, na realidade, ao fim de seis meses não há nenhum aparelho em nenhuma universidade do mundo que permita diferenciar qual das duas faces foi tratada com substâncias rejuvenescedoras."

Existem diversos estudos que confirmam isso. Um dos mais recentes foi apresentado no congresso da Academia Americana de Dermatologia realizado em San Francisco em 2007, salienta Grimalt.

Consulta dermatológica

Diante dos dados, dos costumes adquiridos e da ampla gama de cosméticos, o dermatologista é quem pode avaliar melhor se a pele está saudável, se há algum defeito a corrigir e que tipo de produto pode ser benéfico, sempre em função da idade, do estado da pele, dos antecedentes familiares e da dieta praticada. "Às vezes é preferível gastar dinheiro em uma consulta com o dermatologista do que continuar testando produtos que podem ser desnecessários ou mesmo prejudiciais. Não se trata de engordurar a pele, mas de aconselhar e utilizar o que for necessário em cada caso", adverte Guerra.

A percepção de utilidade ou não dos cremes cosméticos depende em boa parte do que se espera deles. Muitas vezes o que se encontra é satisfação, assim como ao comprar uma roupa de marca ou um carro de primeira linha. Mas não as pessoas não devem se enganar. Se quiserem envelhecer devagar, segundo os especialistas, o melhor cosmético é não maltratar a pele e protegê-la da exposição ao sol. E ter consciência, como salienta Ricardo Ruiz, diretor da Clínica Dermatológica Internacional e chefe da unidade da Clínica Ruber de Madri, de que "um creme jamais proporcionará o mesmo efeito que uma cirurgia ou uma técnica de rejuvenescimento".

Serviço:
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Texto do site do El País